Um pouco de história
Apesar de se saber que os romanos já apreciavam leitão, não são muitos os livros de gastronomia que o referem assado.
Facto é que desde o século XVII que a criação de suínos se tornou excedentária em terras da Mealhada e esse facto constituiu um grande impulso que levou à sua comercialização e confeção gastronómica, sendo hoje em dia um manjar singularmente apreciado em todo o território nacional.
O documento mais antigo que se refere a esta iguaria é uma receita conventual de 1743, provavelmente do Mosteiro da Vacariça, compilada num caderno de refeitório de 1900 por António de Macedo Mengo.
“Uma delícia única. Um manjar digno dos deuses!” Um modo próprio de criar e assar, alicerçado por séculos de tradição, transformou o leitão no símbolo do Concelho de Mealhada, constituindo a sua maior riqueza gastronómica. Com raízes ancestrais no século XVIII, as primeiras notícias de serviços de restauração, organizados como tal, surgem nos primórdios do século XX. Com bases remotas na produção pecuária da raça autóctone bisara, o leitão sempre constituiu um dos meios de subsistência das populações locais, sendo também a mais soberba iguaria escolhida para ser servida em festas religiosas ou pagãs.
Sendo o leitão uma secular tradição culinária local, é atualmente uma das “4 Maravilhas da Mesa da Mealhada”, tendo sido também nomeado para as “7 Maravilhas da Gastronomia de Portugal”.
Tradicionalmente o leitão é apresentado inteiro, numa travessa de porcelana com o comprimento necessário.
Deve ser trinchado, com tesoura própria para o efeito, em pequenos pedaços, devendo ser sempre colocado na travessa com a pele virada para cima, sem nunca sobrepor os pedaços, para que a gordura não altere a textura estaladiça da pele.
Na travessa devem constar pedaços das três partes do leitão: cachaço, costelas e pernil, para assim poderem ser apreciados e conjugados os três sabores da carne.
Deve ser acompanhado com batata frita/ cozida com a pele, salada de alface e laranja fatiada.
O Leitão pode também ser servido no típico Pão da Mealhada, dando assim uma bela sandes de leitão.
As características e qualidade do Leitão da Mealhada variam também com o saber e arte do assador. O forno bairradino tradicional tem orifícios na parede oposta à porta para colocar a vara com o leitão. Na boca do forno é colocado um tijolo que servirá para apoiar a outra ponta da vara.
Ficha Técnica Leitão
Ingredientes e Quantidades:
1 leitão
2 cabeças de alho
1 punhado de sal
1 colher sopa de pimenta branca/ preta
100 g de unto (banha de porco)
Modo de Preparação:
O leitão é morto pelo processo usual na região para o porco adulto, ou seja, com uma picada funda entre as mãos, para o lado do pescoço, com uma faca de ponta afiada.
Seguidamente o leitão é esbolado ou esboldrado, procedendo‐se do seguinte modo: aquece‐ se água numa panela de ferro de boca larga e mergulha‐se lá o leitão até metade, tirando‐se rapidamente para que não coza; coloca‐se numa mesa arrancando logo as unhas (castanholas) das patas que estiveram na água e esfrega‐se energeticamente com uma serapilheira toda a metade que emergiu, arrancando assim os pelos juntamente com uma fina camada de pele da superfície a que se dá o nome de boldra; depois repete‐se o procedimento para a outra metade do leitão.
Lava‐se bem o leitão com água fria e procede‐se ao amanho, limpando‐o de todas as miudezas, fazendo‐se para isso um rasgo no ventre e também um orifício circular em volta do ânus.
Para preparar o tempero juntam-se os ingredientes, num almofariz de madeira. Depois de todos os ingredientes bem pisados adiciona‐se a banha de porco, mexendo sempre até ficar uma massa homogénea. Coloca-se o leitão na vara, que tradicionalmente era de loureiro, depois de pinheiro seco, e atualmente é de inox, que entrará pelo ânus e sairá pela boca. Amarram‐se as pernas à vara ficando as mãos livres.
Seguidamente o leitão é bem barrado com o tempero, tanto por forma como interiormente, introduzindo o restante na barriga e em todas as partes vazias. Cosem‐se depois os rasgos abertos no ventre e pescoço com uma “agulha de coser leitão” e “fio carrete” (fio de linho ou algodão). E posto isto o leitão está pronto a entrar no forno.
O forno de tijolo deverá ser aquecido com feixes de vides, até ficar bem quente, ficando o “rescaldo” no interior que se tapa ou destapa com cinza para ir controlando a temperatura.
O leitão introduzido no forno deverá assar lentamente, durante cerca de 1h30 a 2h00. O leitão vai sendo rodado, proporcionando diferentes posições. Um dos segredos da assadura está em rodar o leitão (sem parar) durante os primeiros 30 minutos. Durante o tempo de assadura o leitão é, por vezes, retirado do forno e borrifado com bom vinho branco da Bairrada. Estes borrifos periódicos feitos com um raminho de louro têm por finalidade tornar a pele dura e estaladiça, não deixando que a pele enfole ou rebente. Este processo da vinda do leitão quente ao ar frio designa‐se “constipar o leitão”.
Quando ao rodar a vara, o leitão não acompanhe os movimentos desta, pode considerar‐se praticamente assado e é altura de retirar o leitão do forno, fazendo‐lhe um orifício no ventre para lhe retirar o molho líquido que aí se encontra, processo que se designa de “sangria”.
O leitão deverá voltar para o forno cerca de 10 minutos para “enxugar”, retirando‐se depois em definitivo.
FONTES E TESTEMUNHOS ‐ Elementos documentais
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COSTA, C. (2012). “Leitão da Bairrada”. Revista O Leitão da Bairrada, nº 6: p. 10-12 SARAMAGO, Alfredo (2003) Cozinha da Beira Litoral: Enquadramento histórico e receitas. Lisboa: Assírio & Alvim
LIMPO, Bertha Rosa (s.d.) O livro de Pantagruel. – 37ª ed. – Lisboa: Convergência. Vol. 1 VALENTE, Maria Odette Cortes (2001) Cozinha de Portugal: Beiras. 3ª ed. – Lisboa: Temas & Debates. (Cozinha de Portugal)
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Produtos tradicionais portugueses, Lisboa, DGDR, 2001
Regulamento do Projeto “Água|Pão|Vinho|Leitão. As 4 Maravilhas da Mesa da Mealhada”